Páginas

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

1 - Manifesto: violencia nem por sentença / 2 - Urbanização À BRASILEIRA mostra intolerância à pobreza

MANIFESTO EM DEFESA DA LUTA PELA MORADIA
Por uma Política Habitacional Digna, Participativa e Democrática

            Nós, representantes de movimentos sociais, entidades sindicais e estudantis, de partidos políticos, de instituições públicas e de outras entidades da sociedade civil, participantes da MANIFESTAÇÃO PÚBLICA EM DEFESA DO DIREITO À MORADIA DIGNA, realizada no dia 11 de agosto de 2011, em frente ao Fórum da Justiça Estadual.

I – CONSIDERANDO:
a)      a inadmissível violência praticada pela tropa de choque da Polícia Militar durante a reintegração de posse da Favela da Família – a qual repercutiu em âmbito nacional;
b)      a total omissão da Prefeitura, tanto em seu dever de intervenção na questão de moradia em ocupações irregulares, quanto no de assistência aos moradores (famílias, idosos, crianças e adolescentes, pessoas com deficiência) – destacando-se o caso da Favela da Família;
c)      a irresponsabilidade e insensibilidade do Judiciário local em sua decisão pela reintegração de posse da área da Favela da Família; enfrentando o problema apenas como simples direito de propriedade, e não como questão social complexa relacionada à função socioambiental da propriedade e ao direito constitucional à moradia digna;
d)     a não cientificação da Defensoria Pública e do Ministério Público estaduais sobre as ações judiciais envolvendo a questão de moradia em ocupações irregulares;
e)      a não requisição do dever da Prefeitura de intervenção na questão de moradia em ocupações irregulares e de assistência aos moradores pelo Judiciário local;
f)       a não autorização pelo Judiciário local para realizar a Manifestação Pública e Pacífica em Defesa do Direito à Moradia Digna no pátio de entrada do Fórum da Justiça Estadual;
g)      o repetitivo tratamento dos movimentos sociais como organizações criminosas, e não como coletivos legítimos e democráticos da sociedade civil pelos órgãos públicos, em especial, pela Polícia e pelo Judiciário;
h)      a não participação efetiva dos moradores e de entidades representativas da sociedade civil no processo de desfavelamento e de construção de moradias populares dignas;
i)        o não cumprimento da função socioambiental do imóvel urbano;
j)        o enorme déficit de moradias populares (cerca de 20 mil domicílios), a enorme quantidade de núcleos de favela (cerca de 42), a imensa quantidade de famílias (cerca de 5.681 famílias e de 26.590 pessoas) vivendo em condições precárias de moradia;
k)      o investimento público insuficiente em programas habitacionais para população de baixa renda e para ações de desfavelamento; principalmente, por parte da Prefeitura municipal;
l)        a inexistência de equipamentos comunitários e serviços públicos próximos e em funcionamento na maioria das áreas de novas moradias populares – quando da realização de transferência das famílias contempladas;
m)    a não implementação do IPTU progressivo pela inexistência de lei municipal e a não efetivação do parcelamento compulsório dos imóveis urbanos subutilizados decorrentes, principalmente, especulação imobiliária;
n)      a não efetivação das áreas de interesse social destinadas a programas habitacionais populares.

II – REIVINDICAMOS:
a)      o cumprimento – por parte da Prefeitura – do dever de intervenção na questão de moradia em ocupações irregulares e de assistência aos moradores (famílias, idosos, crianças e adolescentes, pessoas com deficiência – protegidos pela Constituição); principalmente, nas ações judiciais [arts. 203, 226, 227 e 230, CF];
b)      a observação – por parte do Judiciário –  do problema das ocupações irregulares nas ações judiciais como questão social complexa relacionada ao direito à moradia digna e ao direito à propriedade que atenda a sua função socioambiental urbana [art. 182, CF];
c)      o cumprimento – por parte do Judiciário – do dever de cientificação da Defensoria Pública e do Ministério Público estaduais sobre as ações judiciais envolvendo a questão de moradia; devido à necessidade de defesa dos interesses sociais e direitos coletivos, evidenciados pela proteção constitucional dos moradores (famílias, idosos, crianças e adolescentes, pessoas com deficiência) [arts. 127 e 134, CF; 1º, LONDP; 1º, LONMP];
d)     a requisição – por parte do Judiciário – do dever da Prefeitura de intervenção na questão de moradia em ocupações irregulares e de assistência aos moradores (famílias, idosos, crianças e adolescentes, pessoas com deficiência – protegidos pela Constituição) [arts. 203, 226, 227, 230, CF];
e)      o respeito – em especial, por parte da Polícia e do Judiciário – ao direito constitucional à livre expressão e manifestação individuais ou coletivas em espaços públicos e de forma pacífica [art. 5º, IV e IX, CF];
f)       o respeito ao direito constitucional à livre associação e o tratamento dos movimentos sociais como coletivos legítimos e democráticos da sociedade civil pelos órgãos públicos, em especial, por parte da Polícia e do Judiciário [art. 5º, XVII, CF];
g)      a participação efetiva dos moradores e de entidades representativas da sociedade civil no processo de desfavelamento e de construção de moradias populares dignas; ficando a Prefeitura responsável pela documentação de todo esse processo [art. 2º, II, Estatuto da Cidade];
h)      maior investimento público em programas habitacionais para população de baixa renda e para ações de desfavelamento; principalmente, por parte da Prefeitura municipal através de convênios com os governos federal e estadual [art. 2º, III, Estatuto da Cidade];
i)        a garantia de equipamentos comunitários e serviços públicos próximos e em funcionamento na maioria das áreas de novas moradias populares – quando da realização de transferência das famílias contempladas [art. 2º, V, Estatuto da Cidade];
j)        o respeito – por parte da Prefeitura – às normas de proteção do meio ambiente, de garantia de acessibilidade e mobilidade pela política urbana e pelos programas habitacionais do município [arts. 222 e 227, CF];
k)      o encaminhamento do projeto de lei que institui o IPTU progressivo e a efetivação do parcelamento compulsório dos imóveis urbanos subutilizados – para fins de moradia popular – pelo Executivo municipal [arts. 182, p. 4º, CF; 5º e 7º, Estatuto da Cidade];
l)        a regularização fundiária e urbanização – por parte da Prefeitura – de áreas ocupadas por populações de baixa renda [art. 3º, XIV, Estatuto da Cidade];
m)    a efetivação das áreas de interesse social destinadas a programas habitacionais populares, respeitando a preservação ambiental da área de recarga do Aqüífero Guarani (localizada na Zona Leste).

VIOLÊNCIA: NEM POR SENTENÇA!
Pelo cumprimento da função socioambiental do imóvel urbano.


Entidades Apoiadoras: Associação Amigos do Memorial da Classe Operária – UGT; Associação Cultural e Ecológica Pau Brasil; Associação Paulista de Defensores Públicos (APADEP); Associação Nacional dos Estudantes Livres (ANEL); Central Sindical Popular (CSPCONLUTAS); Centro de Defesa dos Direitos Humanos Irineu Luiz de Moraes; Centro de Direitos Humanos e Educação Popular (CEDHEP); Fórum Social de Ribeirão Preto; Instituto Práxis; Movimento de Mulheres de Ribeirão Preto; Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST); Movimento Pró Novo Aeroporto Regional de Ribeirão Preto; OAB-Ribeirão Preto (confirmar); PCdoB; PSTU; PT;  Seminário Gramsci; Sindicato dos Correios; Sindicato dos Jornalistas; Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (APEOSP); Sindicato dos Trabalhadores em Saúde e Previdência no Estado de São Paulo (SINDSPREV).


__________________________________________________________________ 


Urbanização ‘à brasileira’ mostra intolerância à pobreza
Publicado em agosto 11, 2011 por HC
Compartilhe:
O ininterrupto crescimento da cidade de São Paulo, tanto econômico quanto físico, produz uma perversa desigualdade social. João Ferreira, arquiteto e economista, defende que transformar e tornar esse espaço mais igualitário passa por uma mudança de conduta individual, pressupondo um combate as atitudes que, mesmo de forma velada, reproduzem uma cultura da intolerância aos pobres.
Para Ferreira, aquilo o que hoje é celebrado como modernidade é a causa do padrão urbano excludente. Padrão que não se restringe à cidade de São Paulo, que é apenas o caso mais evidente e que infelizmente serve de modelo para o resto do país. As conclusões estão contidas no artigo “São Paulo: cidade da intolerância, ou o urbanismo ‘à Brasileira‘”, publicado na revista Estudos Avançados
Intolerância que Ferreira define como resultado de uma sociedade em que predomina a indiferença. Ele explica: “a exclusão dos mais pobres produz uma lógica perversa em que as classes dominantes cultivam a sensação de que a cidade funciona sozinha, ignorando que é um contingente populacional importante e pobre que a move, mas que tem que desaparecer findo o serviço”. Não só indiferente, a cidade é também intolerante: “o desprezo, a desconsideração para com as condições de vida dos mais pobres e suas demandas são também motivados por políticas e ações bem determinadas, porém veladas. O que nos remete à sensação de uma espécie de apartheid”.
Políticas implementadas por um Estado que promove uma urbanização desigual, porque é ele quem define a disponibilidade dos chamados instrumentos urbanísticos. Seu papel seria o de garantir uma produção homogênea de infraestrutura pública, evitando, assim, a exclusão das parcelas populacionais de menor renda. No entanto, no Brasil, como explica o autor “confunde-se o público e o privado na defesa dos interesses das elites, e essa equação afetou dramaticamente o modelo da nossa urbanização”. Teria sido desenvolvida no Brasil uma situação de segregação socioespacial em que a população mais pobre, sem opção de moradia, foi se “exilar na periferia”.
Embora causada pelo Estado, a segregação seria legitimada pelas classes dominantes, que o coagem para que aja em benefício delas.
 Exerceria assim o que o autor chama de “racismo à brasileira”, ou seja, um racismo que existe mas não é confesso, e que não por isso faz menos vítimas. Essa intolerância à pobreza é revelada em várias ações, exemplifica Ferreira, como no caso de empreendedores de um condomínio de luxo que, incomodados com a vista para uma favela, acharam por bem ‘estimular’ a saída dos indesejados vizinhos pagando-lhes R$ 40 mil por família. E também uma política da prefeitura de São Paulo que se encarrega da ação de ‘limpeza’, oferecendo o ‘cheque de despejo’, R$ 1,5 mil para sair de suas casas, e R$ 5 mil se a família fizer a ‘gentileza’ de voltar ao seu estado de origem.
O Estado, além de não desenvolver políticas habitacionais que beneficie os mais pobres, acaba por impedi-los de viver em bairros mais ricos. Isso faria sentido pelo Estado ser patrimonialista, legitimado pelas classes mais abastadas, e em que o direito à propriedade está acima do direito à moradia. Uma realidade perversa em que a desigualdade não ocorre por falta de leis, mas pelo contrário, é legitimada por elas.
Ferreira aponta caminhos para reverter essa desigualdade, pois desde a redemocratização do país os governos comprometidos com as demandas populares propuseram uma “reforma urbana”, conseguindo pelo menos inserir essa problemática na agenda política.
 Um exemplo teria sido a criação do Ministério das Cidades e do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social – embora até hoje não tenham tido quase nenhuma efetividade. Essa dificuldade em transformar essas propostas em verdadeiras ações ocorreria, segundo explica Ferreira, porque “uma das razões desse impasse está na dificuldade de transformação do próprio Estado e, em maior escala, do sistema e das práticas políticas que o legitimam. Uma máquina aperfeiçoada durante séculos para dificultar qualquer tentativa de transformação da lógica de produção do espaço urbano desigual não facilita a vida daqueles que participam de gestões com intervenções verdadeiramente públicas”.
Por Isabela Palhares, da ComCiência, Revista Eletrônica de Jornalismo Científico, LABJOR/SBPC.
EcoDebate, 11/08/2011

Nenhum comentário:

Postar um comentário